Rodei, rodei, e no início da tarde fui à “minha ” gráfica , pois há duas semanas não passo por lá e eles estão me devendo uma fornada de meus livrinhos...
Ao chegar , percebi que o responsável por eles não se encontrava, mas como sou de casa , entrei na loja e procurei por quem pudesse me informar o paradeiro de meus filhotes ...
Olhei, olhei, e vi o responsável pela impressão , trabalhando atentamente em uma pilha de papéis que o haviam mandado imprimir . Como é ele quem imprime tudo , cheguei perto e questionei-o sobre os meus livros . Perguntei se ele sabia se haviam sido impressos , se estavam prontos , afinal , cadê os malditos ?
-Olha, os seus livros eu não sei... O único deles do qual eu posso dizer alguma coisa é esse daqui (sacando, da gaveta de sua mesa , um exemplar dos meus , até já meio surrado pelo uso ). Esse aqui eu peguei na semana passada , mas já vou dizendo que não vou entregar porque estou lendo de novo . Aliás , até a minha mãe está lendo... Minha irmã, o namorado dela... Você é o maior sucesso em minha casa ....
Senti minha face corar . Queria estar do outro lado do balcão e dar um beijo naquele rapaz . Queria gritar bem alto :
“-O QUÊ VOCÊ DISSE? FALA MAIS ALTO QUE EU SOU SURDO ...”
Senti-me o máximo , e lembrei-me do Nelson Rodrigues, na estréia do seu “Vestido de Noiva ”, no instante exato que a peça acabou e o público começou a clamar :
-O autor , o autor , o autor ...
Consta que ele , ao final da peça , saiu correndo do camarote onde se encontrava para ir ao palco e enquanto descia as escadas , ouvia o público , que clamava:
-O autor , o autor , o autor ...
Uma vez imaginei como seria encontrar com alguém que estivesse “lendo-me”. Formulava o encontro , imaginava os detalhes , visualizava o momento . Pensava, e já a tinha na ponta da língua , na frase certa e na postura exata que eu deveria demonstrar , sendo eu , agora , “o autor ”...
É estranho “ser lido”. Enquanto escrevia, jamais pensava em encontrar um homem de quem eu não sei nada dizendo ser meu fã . Nunca imaginei que haveria pessoas que eu não conhecia que saberiam como foi a minha primeira vez no sexo , as artes que fiz na escola ou o que penso e o que almoço ...
É muito estranho saber que aquela pessoa que está falando com você sabe que você sabe tudo o que se passa em sua cabeça e o que se passou em sua vida. Jamais imaginei que isso pudesse acontecer , pois enquanto eu escrevia, via os meus leitores , todos , como gente que eu conheço e que têm meu sangue ... A sensação é de estar-se nu , pois eu não saberia o que dizer se ele questionasse sobre o pseudo-suicídio ou sobre minha primeira vez ...
Deixei de lado a braveza que deveria sentir por não haverem entregado meu material . Saí daquela gráfica com um material que , mesmo se buscasse por toda a vida , não encontraria facilmente. Não trazia nada nas mãos , e mesmo com elas vazias e sem o que eu havia ido buscar , sentia-me com a mais completa sensação de dever comprido que já tive em toda a minha vida banal e sem sentido .
Senti ali , naquele local , junto àquele homem que opera as máquinas tendo o relógio contra si , o primeiro e mais profundo sentimento de orgulho de mim mesmo e de algo que eu havia feito por minha livre e espontânea vontade , e descobri que mesmo que nunca venha a ser um escritor de sucesso , tive com aquela pessoa mais do que poderia sonhar em meus mais megalomaníacos sonhos de glória ... E naquela hora eu me senti “O AUTOR , O AUTOR ...”.
2 comentários:
E por falao nisso, está me devendo os quatro primeiros.
Pensa que esqueci, é?
Abraços
Enfim acordou para a vida! Glória a Deus nas alturas!!!!!!!! rs
A propósito: meu pai acabou de ler o 400 réis e perguntou-me como nunca ouviu falar do autor de tão intrigante e deliciosa obra.
PS: Visitei o novo blog, mas confesso que continuo optando pelo Diário de Santa Helena. Aqui me sinto na casa de um velho amigo com quem posso falar de tudo e lembrar de coisas boas do passado.
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