SOBRE O BLOG

Miscelânea intuitiva de gostos, sonhos, desejos, angústias, paixões e destemperamentos, e,porque não, de ódios, raivas e estresses... Miscelânea é assim: TEM DE TUDO!

Meu Diário de Bordo da solidão, meu painel de idéias e guia de entendimento, tudo misturado com humor, drama, terror, anti-corintianismo, sentimentos e doses homeopáticas de papo sério.

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terça-feira, 7 de novembro de 2006

ONDE ESTÁ SADAN

Como citei no post passado que usei o Sadan Hussein em algumas crônicas, desenterrei essa, que foi a primeira CRÔNICA que escrevi na vida, apesar de que acabou virando um CONTO... Recordar é viver...

Onde andará Sadan Hussein?
Eis a pergunta de um milhão de dólares... Cadê Sa-dan?
O bigodudo disse que venceria os infiéis americanos, que nunca chegariam perto de Bagdá, que morreria junto com seus soldados. A guerra acabou e cadê o manda-chuva ira-quiano?
Particularmente, acho que ele está junto ao Bin La-den, outro cascateiro que fugiu com o rabo entre as pernas do Afeganistão, num bordel barato, no Paraguai (ia dizer que ele estava num bordel barato na capital da Síria, mas não me lembro o nome da cidade. Acho que temos muitos bordéis ba-ratos também em Assunção, né?!).

Estão os dois, ele vestido com um roupão de seda azul, de boina e óculos escuros, para não ser reconhecido, enquanto Bin Laden serve drink’s no estabelecimento, para ganhar alguns trocados e comprar um avião novo só pra ele...
Ridículo isso, né?! Sim, eu sei... Não estou com ne-nhum pouco de inspiração para escrever hoje. Às vezes, isso acontece nas melhores famílias...
Vi o noticiário da guerra do Golfo e quis falar sobre o assunto, deveras intrigante, mas, desculpem, não deu. Há di-as que busco, busco, busco e nada sai da cachola!
Falta de inspiração... Espero que seja somente isso. Às vezes, tenho medo do poço secar e não haver mais ne-nhuma inspiração, nunca, nem o suficiente para escrever uma única crônica de meia folha A5...
Síndrome de Pollyanna, pelo menos eu não tenho pressão alguma para escrever. Ninguém vai me despedir ou gritar comigo pelo fato de não haver enviado uma lauda ou a crônica do dia. Ou pior, o livro inteiro...
Imagino um escritor de sucesso, que vendeu um mi-lhão de cópias de seu livro e tem um contrato milionário com uma editora para lançar, em maio, um novo livro. Estamos em abril. Os dias vão passando e ele, em dúvida e dor, não sabe se casa a mocinha da história ou mata o pai dela, atropelado por uma horda de búfalos selvagens, na ilha de Marajó e a faz lésbica, fazendo o mocinho jogar-se no rio Tietê e tomar sua água. Dúvidas, dúvidas, eis o que há na cabeça de nosso bom escritor...
O editor liga:
-Pronto? -atende uma voz despreocupada.
-Paulo Rabbit?-pergunta um sujeito com voz esgani-çada e em tom monocórdico.
-Sim, sou eu, quem deseja?
-Qualé, Paulo Rabbit... Preciso do original do livro... Lembre-se da multa do seu contrato por não entregar a tem-po...
-Pode deixar, seu Magalhães (bom nome pra um edi-tor carrasco!). Estou só finalizando o livro...
-Você está reescrevendo a bíblia sagrada?
-Não, por quê?
-Pela demora na entrega, vai ter umas duas mil folhas esse seu livro... Vê se para de me enrolar e traz o original a-qui!- e desliga o telefone, na cara de um apático e estarrecido escrito, que lembra do que acaba de dizer:
“Estou só finalizando o livro...”
Ah, como é linda nossa língua portuguesa! Como é possível transformar o caos em luz, mudando uma ou outra expressão... “Finalizar” é um bom eufemismo para dizer que ele não sabe o que vai fazer com as personagens, não sabe como o livro vai acabar, não sabe quando vai terminá-lo e tem medo de dizer. Ele pensa:
“Meu Deus... O prazo está acabando!!!”
Olha o relógio na parede, que marca, incessantemen-te, os poucos segundo que lhe faltam:
-Tic, tac, tic, tac...
Olha a folhinha, pregada sobre o computador, onde é visível um forte e bonito São Jorge, matando um cruel e monstruoso dragão:
-Dia vinte e dois de abril...
Paulo pensa consigo mesmo:
“Como eu queria ser aquele dragão!! Como eu queria morrer e não ter de entregar isso...!”
Levanta-se da cadeira, nervoso. Abre a geladeira e olha-a atentamente, de cima a baixo. Escolhe e pega uma cerveja. É exatamente daquilo que ele precisa. Abre a latinha. Bebe. Bebe quase meia lata em um só gole. Olha para o computador, agora não mais um amigo e companheiro, e sim um instrumento opressor que o lembra a todo o instante:
-VOCÊ TEM DE ESCREVER... Você tem de escre-ver...
Olha o relógio, no canto. Observa os ponteiros anda-rem, cada vez mais rápido, para lembrá-lo:
-VOCÊ ESTÁ ATRASADO!!!
Olha o telefone e tem medo de que toque de novo. Caminha até sua cadeira, senta-se. Ele bebe o resto da cerveja em um só gole, sentado em frente ao computador. Olha a tela. Sacode a cabeça, com força. Nada.
Levanta-se de novo. Dá mais uma olhada na geladei-ra. Pega mais uma cerveja. É exatamente aquilo que ele pre-cisa para inspirar-se. Senta-se de novo em frente ao compu-tador. Abre a latinha e bebe. Olha o monitor, que agora está ainda mais intimidador e opressivo que antes, pois com a de-mora em mexer no mouse, surgiu a tela de proteção, onde piscava as palavras: Paulo Rabbit, escritor...
-Acabou... Você não sabe como terminar essa histó-ria!!!
Mata a latinha em mais um gole.
Levanta mais uma vez, apoiando-se na mesa. Dá uma olhada na geladeira, quase que se certificando que ela ainda está lá. Está. Nada de novo acontecendo dentro dela. Pega mais uma cerveja. Ele precisava mesmo era de inspira-ção, mas como ela não vem, dane-se: serve uma boa cerveja mesmo. Senta-se em frente ao computador. Bebe tudo. Olha-o e vê no monitor as letras piscando e mexendo, dançando em sua frente, ébrias como ele começava a ficar, letras que parecem estar piscando, com os dizeres:
-Loser, loser!! (computador bilíngüe!).
Levanta-se da cadeira, com cuidado para não cair. Revoltado, abaixa a calça e mostra a bunda para o computa-dor, gritando:
-Eu odeio você! Maldito...
Sobe as calças e vai, mais uma vez, até a cozinha. Abre a geladeira, que ainda está lá (ô mania de olhar a gela-deira!). Pega mais uma brêja gelada (ela evoluiu!) e bebe. Jo-ga a lata no chão, abre a geladeira, mais uma vez, e pega ou-tra. Era exatamente isso que ele precisava: um porre! Volta à sala, olha o computador, cujas letras dançam um cancã em sua frente.
-Eu tenho saudades de minha máquina de escrever...- diz, melancólico e saudosista.
Desliga o computador pela tomada, não sem antes salvar o pouco que havia escrito antes (está bêbado, mas não é burro!).
Deita em sua cama e dorme. Tem um sonho maravi-lhoso, no qual ele morre no final, assassinado pela sogra, que o mata, pica, mói no moedor de carne e faz um pastel para a filha, que não sabe que acaba de comer o próprio marido e diz para a mãe:
-Nossa, que pastel gostoso, mãe!
-Fiz com carinho pra você, minha filha... A carne é de segunda, mas o carinho compensa a qualidade...
Durante o sonho, vendo aquilo tudo, Paulo Rabbit, pe-la primeira em sua vida, sente algum carinho pela sogra... A-corda feliz, mas viu que era só um sonho. Estava vivo, infe-lizmente, e teria que enfrentar a triste realidade. Pensa em li-gar para a sogra, quando o telefone toca:
-Paulo, cadê o livro, Paulo???!
-Ops, seu Magalhães!! Até a noite o senhor vai saber de seu livro!
Bate o telefone na cara do Magalhães. Não agüentava mais aquela pressão. Senta-se novamente em frente ao com-putador, liga-o e espera o maldito Windows abrir. Demora um século quando estamos com pressa. Daí abre o maldito scan-disk, que demora outro século. Fazer o quê? Quem mandou desligar o computador da forma mais rápida, puxando pela tomada?
Abre a tela do Windows. Abre o seu texto e olha, olha, não sabe sobre o que escrever. Relê o último trecho que es-creveu:

“... enquanto ela o esperava, linda de morrer, ele es-tava no banheiro, com cólicas renais, bebendo água da tornei-ra, sem saber de todo o amor que existia no mundo e era vol-tado para sua pessoa...”

-Isso é horrível!!!! -grita alto, em sinal de revolta.
Revoltado, ele se levanta. Sabe que é um escritor de sucesso, que o mundo sabe quem ele é, que é reconhecido, comentado, incensado, mas acabou. Tornou-se uma fraude de si mesmo. Seu nome nas capas dos livros é mais impor-tante do que o conteúdo, mas tudo tem um limite, e ele havia passado, de longe, esse limite. Secou o poço. Não sabe sobre o que escrever. Não tem mais o único talento que o diferenci-ava dos demais. Não consegue escrever sobre mais nada! Sua última linha provava isso! Acabou! Tornou-se um comum!
Não podia viver assim. Anda até a cozinha, abre a ge-ladeira, que ainda estava lá. Não tem mais cerveja.
-Não, não, não, eu não agüento mais essa vida cani-na... Não agüento essa pressão!
Olha a folhinha:
-São Jorge, meu São Jorge! Me ajuda a viver, meu santinho...
Toca o telefone;
-Paulo, por que você bateu o telefone na minha cara?
-Aaaaaaahhhhhhhhhhh!!!!!! Eu não agüento mais is-so!!!!
Paulo Rabbit larga o telefone e corre para a cozinha. Olha a geladeira, que ainda está lá (ela sempre está lá!), pega um litro de álcool debaixo da pia e joga em seu corpo. Espa-lha o álcool pelos cabelos e empapa a sua roupa com ele. A-bre mais um litro e encharca as calças, os sapatos, ainda mais os cabelos...
Nesse momento, tem um estalo divino, e descobre o que fazer com sua personagem...
-É isso!!!! É isso!!!! Isabela vai morrer porque seu a-mado não a quer mais ao seu lado!
Eufórico, corre para o computador. Senta-se em frente à tela, apaga aquela última frase horrível que havia escrito e continua a escrever, agora com o toque de genialidade que sempre teve mas que acreditava perdido para sempre. Sente-se o máximo de novo. Sente-se vitorioso. As palavras fluem de seus dedos, como se fossem ditadas por Deus, diretamen-te para sua mente e dela para a tela.
-Obrigado meu são Jorge...
Enquanto escreve, tem a certeza de que está fazendo o melhor livro de sua vida. Sabe que está surgindo ali, naque-le instante, o maior personagem que já escreveu, e quem sa-be, o maior personagem jamais escrito. Sabe que aquele tra-balho irá imortalizá-lo.
Enquanto escreve, estica um braço, quase sem olhar para o lado. Continua escrevendo, catando milho no teclado com a mão esquerda, enquanto com a direita pega o maço de cigarros, que está sempre ao seu lado. Continua escrevendo quando, num gesto rápido, retira do maço um cigarro, que vai parar no canto direito de sua boca. Acende-o. Na primeira tra-gada, uma longa e deliciosa tragada, vê seus problemas e to-do o seu estresse sumindo, como a fumaça que sai do seu ci-garro. Mais uma tragada, e outra, e outra... Algumas brasas caem de seus dedos, em sua calça. Ele se incendeia. Havia se esquecido do álcool, e agora era tarde. Pega fogo, tem seus cabelos queimados, todos os poros de seu corpo doem ao mesmo instante, mas, mesmo assim, ele está feliz por, pe-lo menos, ter descoberto antes da morte que não havia seca-do o poço, que ainda tinha inspiração. Melhor morrer sabendo que ela ainda existe do que viver sabendo que ela acabou e nos tornamos só mais um...
Inspiração... Às vezes, ela aparece, vinda do nada, dando sinais de que o poço ainda não secou. Outras vezes, somem, justamente quando precisamos que ela apareça. Vai saber de onde elas vêm?
Vai saber onde está Sadan Hussein...

2 comentários:

Anônimo disse...

Nossa nossa hein.. eu sabia q ia vir algo chocante nesse final.
Adorei!
Fantástica essa crônica.. :)

Já me senti assim tb, sem inspiração, sem talento.. enfim, total desespero nessa hora.. pra minha sorte num tinha nenhum Magalhães me ligando.. cruuuuuuuuzes viu..


beijOooo enorme amigo!

Anônimo disse...

Nossa adorei..
;D